Grupo Mulheres do Brasil Núcleo Paris discute as conquistas e os desafios ainda a enfrentar pelas mulheres no caminho da igualdade de gênero nessa modalidade esportiva.
No jogo em que tornou-se a maior artilheira da história das Copas do Mundo de Futebol – masculinas inclusas -, com 17 gols, a brasileira Marta garantiu o gol da vitória brasileira sobre a Itália, por 1 a 0, sem gastar seu batom. De tom roxo encarnado, o batom que durou os 80 minutos em que a jogadora esteve em campo não só virou pauta para toda a imprensa como tornou-se símbolo do empoderamento feminino que a jogadora conquista há anos, por meio do futebol, para todas as mulheres.
Considerada seis vezes consecutivas a melhor jogadora de futebol feminino do mundo, Marta também já havia chamado a atenção da mídia mundial nesta Copa não só por seu jogo. Na partida da seleção brasileira contra a Austrália, suas chuteiras traziam estampado o símbolo de igual (=), em referência à campanha “Go Equal”, que prega reconhecimento para as mulheres no futebol semelhante ao dos homens. A brasileira também não conta com nenhum patrocínio esportivo, pois recusa-se a receber os valores propostos pelas marcas – muito inferiores aos dos homens.
“O grande desafio hoje é fazer com que as pessoas entendam que o futebol feminino é uma profissão como outra qualquer, como é no masculino, e que isso tenha seu devido valor”, pontua a advogada Maria Luiza Cavalcante Lima, que cursou Gestão de Futebol, e é líder do Comitê de Esportes do Grupo Mulheres do Brasil.
Ela explanou sobre “A Evolução e o Empoderamento da Mulher por meio do Futebol Feminino”, dia 17 de junho, na Embaixada do Brasil em Paris, durante encontro promovido em parceria pela Câmara do Comércio Brasil França e Grupo Mulheres do Brasil Núcleo Paris.
“Foi um evento enriquecedor que nos trouxe informações e curiosidades interessantes desse mundo do futebol feminino, que está começando a ser visto, ouvido, valorizado e respeitado”, vibrou Andrea Clemente, líder do Grupo Mulheres do Brasil Núcleo Paris.
Maria Luiza discorreu sobre os desafios do futebol feminino, de uma maneira geral, e no Brasil em especial, onde a prática do esporte foi proibida para mulheres de 1940 a 1979. “O argumento era de que o corpo da mulher não aguentaria os desafios físicos e a intensidade de um jogo de futebol”, contou. Mas, mesmo com a proibição, as mulheres continuaram jogando futebol e algumas foram presas por causa disso, o que denota a grande resiliência do sexo feminino.
Hoje, o grande desafio das mulheres nesse esporte é fazer com que as pessoas entendam que o futebol feminino é uma profissão como outra qualquer e merece ter seu valor reconhecido. “Principalmente porque as regras são exatamente as mesmas, o campo é exatamente o mesmo, as mulheres jogam da mesma forma e elas não têm a mesma remuneração. Muitas não são profissionais, são tratadas como amadoras”, comenta a líder do Comitê de Esportes.
De acordo com ela, outro desafio que o futebol feminino tem no Brasil é conseguir implementar a regulamentação da Fifa (Federação Internacional de Futebol), para que todo o time que jogue o campeonato da série A, em 2019, e da série B, em 2020, tenha duas equipes de futebol feminino – uma principal e uma de base, onde ocorre a formação de novos talentos. “Temos que fazer com que a regulamentação seja cumprida de maneira decente, digna, para que essas mulheres tenham salário profissional, que as possibilite viver disso. Porque, muitas vezes, em alguns lugares, os times oferecem só a camisa, mais nada – nem estrutura, nem salário. Essas mulheres acabam não conseguindo desenvolver o futebol como atividade principal”, explica Maria Luiza.
Ela cita ainda, além de nossa Marta, outro grande exemplo de luta por igualdade de gênero no futebol: “A atual melhor jogadora do mundo, a norueguesa Ada Hegerberg, não está jogando a Copa por discordar da forma desigual como o país dela trata o futebol feminino, em comparação com o masculino. Ela ganha 400% menos que o Messi, por exemplo. A nossa Marta ganha em um ano o que um jogador mediano do Palmeiras ganha em três meses”, exemplifica.
Bom negócio
Na segunda parte do encontro, a jornalista e mestre em Comunicação e Marketing Daniela Pacheco, atualmente coordenadora da mesa de Esportes e Turismo do CRBE (Conselho de Representantes de Brasileiros no Exterior), falou sobre “Visão de Negócios e Marketing do Futebol Feminino”.
Para Daniela, o futebol feminino tem se tornado um grande símbolo da luta por respeito e reconhecimento da mulher em qualquer área do mercado de trabalho. “Também é o retrato do que é se trabalhar em equipe atrás de um sonho”, disse.
Sobre o batom usado com orgulho por Marta no jogo da seleção, disse que é uma prova do que sempre falou em suas palestras mundo afora: “as grandes marcas podem confiar e investir neste segmento, porque, sim, dá retorno. Afinal, virou ou não virou um dos assuntos mais comentados nos últimos dias?”, provoca.
É verdade que, oficialmente, o tal batom pode trazer dor-de-cabeça para a Fifa, que tem seis patrocinadores oficiais e o da marca de cosmético usada por Marta, em uma ação involuntária de marketing de intrusão, não está entre eles. Mas esta é outra história.
Daniela lembra que, na indústria do entretenimento mundial, o setor que movimenta mais dinheiro é o futebol. “Nao é a Disney! O que temos que pensar é que o clube é uma empresa e que tanto o time masculino como o feminino são excelentes produtos. E o que vai trazer êxito é trabalho duro, ter bons produtos, saber onde e quando investir, foco… por aí vai…”, comenta.
Ela destaca alguns números da Copa do Mundo de Futebol Feminino no tocante à publicidade: os patrocinadores passaram de apenas três para 16; mais de 135 países estão envolvidos; 130 emissoras de comunicação estão fazendo a cobertura – no Brasil, a Globo e a Band transmitem pela primeira vez os jogos para mais de 1 bilhão de pessoas.
“Há anos venho falando da necessidade de um maior espaço na mídia… E hoje está sendo aberto e estamos conseguindo mostrar de forma massiva que o Futebol Feminino, além de ser um espetáculo, é um bom negócio. É só saber acertar nas estratégias e ações de marketing e fazer gol, com ou sem batom”, conclui.
Por Silvia Pereira
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