Texto: Comitê de Igualdade Racial Grupo Mulheres do Brasil Núcleo Franca
Quem se limita a ouvir a doçura da fala de Mariana, não consegue calcular a mulher forte, militante guerreira e educadora competente que ela é. Hoje, na série “Tocando no Assunto” um pouco do que pensa Mariana Coelho Rosa, membro do Grupo Mulheres do Brasil Franca, ativa no Comitê Igualdade Racial.
Graduada em Letras, Pedagogia e Supervisão Escolar e Pós-graduada em Educação, Mariana é militante do movimento negro, atua fortemente em ações afirmativas e políticas. Foi Secretária Municipal de Educação em Franca, SP. Integrante do Conselho Estadual de Representantes do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (APEOESP), Conselheira nos Conselhos Municipais de Educação (CME), Dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCAF) e Vice-Presidente do Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra (COMDECON). Participa do Coletivo Milton Santos da Apeoesp, do Coletivo as Pretas e do Grupo Rainhas Magas.
Confira sua entrevista inspiradora e motivadora:
O que é militância para você?
Para mim é estar comprometida de forma consciente com as causas que acredito, lutando com o objetivo de transformar a realidade social, educacional, política e ética. Para isso, comprometo meu tempo, conhecimentos, talentos e energia em prol dos meus ideais. Há momentos em que a militância pesa, dói, angustia, mas na maioria das vezes faz bem, faz feliz e nos impulsiona a continuar nessa luta que não é individual, mas coletiva por um mundo possível com equidade e respeito a todes.
O desempenho escolar de crianças negras e crianças brancas apresentam muitas diferenças?
A escola, em alguns casos, pode ser um ambiente hostil para a criança e para o adolescente negros, quando não se lhes é permitido sentirem-se pertencentes àquele espaço. A relação preconceituosa dos profissionais e ou colegas com eles podem desencadear bloqueios e dificuldades para o desempenho escolar deles. Não se reconhecerem em quase nada que lhes é apresentado, ter suas características físicas, sua cultura, seus valores negados e ou ridicularizados certamente podem ser fatores limitantes para o bom desempenho dos mesmos.
Que mudanças são necessárias na Educação para contemplar a Negritude?
Infelizmente, muitas vezes é na Escola que nossas crianças são apresentadas ao racismo, à discriminação e preconceitos. O primeiro passo é reconhecer que nossa sociedade e, consequentemente, nossa educação é racista, assumindo mudar essa situação. Tornar a Escola um espaço onde caibam todas as diferenças e elas convivam com respeito. Onde todos possam se ver e sentir-se valorizados. É necessário tocar em assuntos que muitas vezes a Escola tenta jogar para “debaixo do tapete”’ e afirmar que “aqui essas coisas não acontecem porque somos todos iguais”. É preciso profissionais sempre vigilantes e que não se omitam quando situações de racismo, discriminação e preconceitos acontecerem. É imprescindível formação séria e consistente para que os profissionais se sintam fortalecidos e em condições reais de oferecer educação de boa qualidade, nas mesmas condições para todos. É imprescindível tornar viva a Lei 10639/03 na Escola, ressignificar o ensino da verdadeira História brasileira, atentar para as palavras ditas em sala, apresentar referências negras aos estudantes, na literatura, poesia, história, música, ciência, na Geografia e em todas as áreas do conhecimento.
Como em nossas famílias e no cotidiano podemos combater o Racismo?
Combater o racismo e todas as formas de discriminação e preconceito parte de cuidar de nossas falas e ações cotidianas. Não nos omitindo sempre que atitudes racistas, preconceituosas e discriminatórias ocorrerem ao nosso redor. Lendo autores negros como Ângela Davis, Conceição Evaristo, Abdias Nascimento, Lélia Gonzales, Carolina de Jesus, Carlos de assumpção, Toni Morisson, Djamila Ribeiro, Silvio de Almeida e muitos outros para nos alimentar. Conversar com as crianças sobre questões raciais inclusive incluindo os indígenas e outras etnias. Comprar bonecas negras para as crianças. Valorizar e incentivar o empreendedorismo negro. Não se sentir culpado pelas ações e posturas dos nossos antepassados, mas nos responsabilizarmos pela herança de privilégios e por agir firmemente pela erradicação do racismo. Observar os espaços em que atua, incentivar a diversidade e, quando estiver em situação de liderança e comando, criar possibilidades para acesso de mais pessoas negras.
Você vê mudanças desde quando começou a falar da causa da Igualdade Racial para hoje? Tivemos ganhos?
Com certeza sim. A luta do nosso povo preto rumo à liberdade e depois igualdade de direitos e oportunidades vem de muito tempo e hoje já acumulamos muitos avanços. Cito aqui as políticas públicas afirmativas na Educação (Lei de Cotas Raciais, FIES, PROUNI), Lei 10.639/03 que preconiza o Estudo da História e Cultura Africana e Afro-brasileira nas Escolas, Lei 7616/89 que pune crime de Discriminação Racial (Lei CAÓ), Dia Nacional da Consciência Negra e muitas outras conquistas. Hoje já falamos abertamente sobre racismo, discriminação e preconceitos e as alternativas para superá-los. O mito da democracia racial brasileira caiu por terra. Avançamos bastante mais ainda temos árduo e longo caminho a trilhar. Com a força dos nossos ancestrais, que das formas mais inusitadas bravamente lutaram contra a escravidão, hoje denunciamos o racismo estrutural e institucional que massacra nossa gente, a violência policial que mata nosso povo, a falta de atenção adequada na saúde, moradia, alimentação. Mas nós vamos resistindo e insistindo sempre porque, como afirma o poeta Carlos Assumpção, “Não pararei de gritar”!
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