Em março próximo, a comunidade de Paraisópolis, em São Paulo, ganha de presente um aplicativo e uma plataforma online que conectará empregadores a moradores em busca de emprego. Por sua importância e apelo social, o projeto “Quero Trampo” – que está sendo chamado de “Tinder do Emprego” – será apresentado a alunos e docentes do MIT (Massachusetts Institute of Technology), em Cambridge (EUA), em abril, pelos grandes responsáveis por sua concretização: o estudante de Engenharia Mecatrônica no Insper (Instituto de Ensino e Pesquisa) Davi Dom Bosco Silva e a de Marketing da Faculdade Ítalo-Brasileira Flávia Campos Rodrigues.
Tudo começou quando a engenheira ambiental e doutoranda em Engenharia Mecânica Juliana Miranda Mitkiewicz decidiu ministrar, em uma comunidade de São Paulo, um curso de férias da disciplina que ministra na graduação do Insper: “Design em Contextos Sociais”. A proposta do curso era desenvolver soluções para problemas sociais da comunidade escolhida e abrir suas vagas a alunos de outras universidades e moradores locais.
Para escolher a comunidade, Juliana participou de uma reunião do Comitê de Bairros e Comunidades do Grupo Mulheres do Brasil, onde conheceu uma de suas líderes, a pedagoga Rejane dos Santos, e a universitária Flávia, que também integra o Comitê Meninas do Brasil. “A Rejane me convidou a conhecer a comunidade e fui parar na ‘Feijoada das Marias’. Foi ótimo! Fiz a proposta de sediar o curso em Paraisópolis e eles – a União dos Moradores – aceitaram”, conta a professora.
Flávia, que mora em Paraisópolis, onde é educadora social no Coletivo Jovem Coca-Cola, ingressou no curso, no mesmo grupo de trabalho de Davi, filho de um casal de vendedores de pão de queijo de Franca (interior de São Paulo), que estudou a vida toda em escolas públicas e conquistou uma bolsa no Insper com seus próprios esforços. A primeira tarefa deles foi conhecer a comunidade para, em seguida, identificar suas problemáticas usando a metodologia Design Thinking, ensinada por Juliana. “Eles entenderam como se cria empatia, necessária para entender os desafios da comunidade”, explica a professora.
Nas ruas de Paraisópolis, os universitários fizeram várias entrevistas para entender qual era “a maior dor” enfrentada pelos moradores. Entre tantas carências básicas, como dificuldades de acesso a saúde, educação e segurança, o desemprego foi o problema mais relatado. Os universitários escolheram, então, como objeto de estudo e trabalho do curso “A problemática da empregabilidade na favela”. Era hora de buscar na comunidade ideias para solucioná-lo.
Oferecendo dignidade
Flávia e Davi chegaram ao Emprega Paraisópolis. Fundado e tocado quase que exclusivamente por Rejane, o projeto faz a conexão entre empregadores e moradores da comunidade, oferecendo, ainda, alguma qualificação profissional. Mas os estudantes perceberam que, numa comunidade com mais de 100 mil habitantes, o deslocamento até o projeto é um fator limitante dos cadastramentos, que são presenciais e centralizados só em Rejane. “Faço questão de atender pessoalmente para entender a situação de cada pessoa e o atendimento ser o mais humanizado possível”, explica a pedagoga.
“Pensamos, então, numa forma de facilitar o trabalho da Rejane e também de diminuir o consumo de papel”, conta Flávia, que ajudou a dar a ideia do aplicativo e da plataforma. Mesmo após o curso terminar, ela e Davi continuaram a trabalhar no projeto, com o objetivo de torná-lo realidade. Atualmente, as ferramentas estão em fase avançada de desenvolvimento e a previsão é de que suas versões beta (em que são feitos testes de usabilidade) sejam lançadas em março.
Rejane vai coordenar um processo de capacitação dos moradores para uso das ferramentas. “O perfil deles ainda não é todo familiarizado com o online”, explica a líder, que está otimista quanto aos resultados do projeto. Ela acredita que aplicativo e a plataforma vão tornar os serviços do “Emprega Paraisópolis” mais acessíveis e ágeis. “Minha expectativa é que a gente possa ampliar o número de empresas contratando nas comunidades. O objetivo primordial é que muitos moradores não voltem à situação de extrema vulnerabilidade social e que, daqui um tempo, a gente possa levar o modelo do ‘Emprega’ para outras comunidades. Quero que seja referência em empregabilidade no Brasil”, sonha Rejane.
Já Flávia quer gerar mais oportunidades para as pessoas de Paraisópolis e mudar a visão que as pessoas têm de seus moradores. “Sempre quis fazer mais pela comunidade, pois ainda achava pouco meu trabalho como educadora social”, diz.
Vaquinha virtual
Uma parceria entre o Insper e o MIT Brasil, braço da universidade norte-americana no País, possibilitou que a professora Juliana fizesse a Davi e Flávia o convite para apresentarem o projeto “Quero Trampo” no campus de Cambridge, durante evento comemorativo. Ela ainda alinhou a participação de Flavia, como líder de comunidade, no Brasil Conference Comunidades, conferência internacional para debater as questões brasileiras e incentivar criação de políticas públicas para comunidades carentes, que também ocorrerá no campus. Flavia deve embarcar para os Estados Unidos no final de março.
O MIT Brasil arcará com as despesas de transporte e hospedagem dos dois universitários, mas eles ainda precisam levantar cerca de R$ 10 mil, para custear sua alimentação durante a estada no país. Por isso, ambos estão vendendo chaveiros com a mensagem “I Love Paraisópolis”. Paralelamente, Davi começou a procurar estágio para as férias de verão e Flavia está fazendo uma vaquinha virtual. Quem quiser contribuir pode acessar o link clicando aqui.
Por Sílvia Pereira
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